Quarentena: como suportar (1)

O Jornalista Boécio Vidal Lannes, de 63 anos, conta como tem sido a sua quarentena

Escrito por Boécio Vidal Lannes, 11 de Maio às 13h40 

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Fui provocado pelo editor deste blog, Felipe Pinheiro, a contar como estou vivendo nesta quarentena.

Antes de começar preciso localizar o leitor sobre a minha moradia. Vivo numa vila de sete casas logo na entrada da Favela Nova Aurora, na Taquara/RJ. No centro do quintal, uma frondosa goiabeira nos dá frutos e alimenta papagaios, sabiás, pardais, micos e morcegos. Como as folhas sempre caem, é preciso varrer o terreno todos os dias.

Boécio e sua esposa Márcia.

Segundo minhas observações, a favela, que começou a crescer na década de 1970, tem cerca de 600 casas que abrigam 2.500 moradores (não há registro no IBGE). No meio da favela há um campo chamado Nova Aurora, rodeado de moradias e botecos. Naquele gramado perfeito, ainda adolescente, o famoso Edmundo deixava o povo boquiaberto com seus notórios dribles.

Agora sim, vamos do isolamento. Estamos em casa desde o dia 11 de março, cada qual cumprindo suas tarefas. Minha esposa Márcia, 57 anos, exímia cozinheira, não sabe mais o que fazer para agradar: frango, peixe, carne assada, bife simples, à milanesa; mandioca frita, berinjela frita, batata frita; angu com quiabo, mostarda refogada, jiló. Com tanta comida, estamos mais pesados. Também aumentamos o consumo de cerveja e de vinho para aguentar o tranco.

Eu fico mais recluso, pois completei 63 anos. Minhas mãos estão finas de tanto lavar louça. O chuap chuap chuap da máquina de lavar nunca foi tão presente. Suja-se muita roupa de cama. Gasta-se muito Surf e Omo. Passo a mão num livro. Mas logo vem os maus presságios da covid-19; morreram mais 615 pessoas, informa a TV.

Luiz Cláudio, 38 anos, filho da Márcia, está com a gente desde o início da pandemia. Vai ao mercado, à farmácia, ao banco pagar os boletos. Ele também auxilia a irmã, Adla Fernanda, 27 anos, nas compras do dia a dia.

Bruno, 5 anos, filho da Adla, é o nosso neto. Bruno sabe tudo sobre o coronavírus. Também, pudera! Só se fala dessa praga. Como toda criança esperta, é ele quem traz um pouco de alento com suas frases certeiras: “O Luiz Cláudio foi de máscara e luva buscar meus ‘tabalinhos’ na minha escola para eu poder estudar em casa”, disse ele.

Com 89 anos, dona Aidiu, minha sogra, não suportou o isolamento. Sempre adorou cantar em karaokês do bairro. Fugiu duas vezes e foi capturada pelas filhas Márcia e Valéria, 55 anos. Ficou aqui em casa 51 dias. Se incomodou até com a Charlotte, nossa cachorra de 5 anos, que espalha pelo por toda a casa. Faz dez dias que a dona Aidiu voltou para a casa dela e, livre das amarras, já foi vista na rua sem máscara.

No sábado teve festa no cafofo. Márcia recebeu o auxílio “quase” emergencial de R$ 600,00. “Quase” por que o dinheiro demorou 30 dias para cair na Caixa.

A grande novidade dessa quarentena, além do vírus Sars-Cov-2, são as lives de famosos. Como aqui em casa o povo é do samba, já assistimos Xande de Pilares, Belo, Vou pro Sereno, Pixote, Mumuzinho, Zeca Pagodinho. Abrimos uma exceção para o icônico Roberto Carlos. Cantamos com a rainha Alcione – e colaboramos com R$ 25,00 para a sua campanha beneficente.

Registros de quarentena

Imagem do porteiro chamado Roma, com a Poliomielite, na cidade de Mênfis, primeira capital do Egito (1.300 anos a.C.).

Pragas ceifaram milhões de vidas ao longo da história. O Egito Antigo já convivia com a Poliomielite. A vacina Sabin (nome do cientista), introduzida em 1962, mostrou-se mais eficaz nas campanhas de vacinação em massa pela comodidade da administração da gotinha. No Brasil, o último bacilo Poliovírus Selvagem ocorreu em 1989, na cidade de Souza/PB, segundo o Ministério da Saúde.

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